domingo, 20 de dezembro de 2009


UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

UNIDADE DE PRODUÇÃO PEDAGÓGICA SAÚDE, SOCIEDADE E HUMANIDADES

PROFESSORA MARTA JULIA MARQUES LOPES

MÓDULO SOCIOLOGIA DA SAÚDE

GRADUAÇÃO EM ANÁLISE DE POLÍTICAS PÚBLICAS E SISTEMAS DE SAÚDE

SÍNTESE DO TEXTO CORPOS INDIVIDUAIS E SOCIAIS

Todos os seres humanos possuem simbolicamente dois corpos: um corpo individual e (adquirido ao nascer) e um corpo social (necessário para se relacionar em sociedade).

O corpo social:

· Essência da imagem corporal;

· Enquadramento para perceber e interpretar experiências físicas ou psicológicas;

· Ferramenta pela qual a sociedade controla/influência o comportamento físico dos indivíduos;

Através do corpo social a sociedade pré-determina nossas escolhas, e controla o corpo individual. Essas escolhas estão condicionadas ao sistema social/cultural que estamos inseridos, ou seja, ao meio em que vivemos. Para entender o funcionamento e conviver em sociedade o corpo nos dispõe de “símbolos naturais”, são feitas analogias entre esses símbolos e o funcionamento da sociedade – cabeça do governo, coração da sociedade; que nada mais são além de associações entre a função de determinada parte do corpo individual e alguma entidade social. Como sabemos, por exemplo, que na cabeça está o nosso cérebro que comanda o funcionamento de todos os outros órgãos, quando usamos a expressão “cabeça do governo” entenderemos, automaticamente, que será nesse setor/lugar/órgão que está a pessoa ou o grupo de pessoas que irão comandar todos os outros órgãos governamentais.

Tipos diferentes de sociedades possuem tipos diferentes de culturas, e mesmo em uma mesma sociedade coexistem várias culturas diferentes, e cada uma dessas culturas irá direcionar as escolhas de seus indivíduos para controlar e manter a ordem social, e produzirá padrões de normalidade que serão aceitos, tudo o que estiver fora desses padrões de normalidade, será excluído.

“As diferenças de pura conformação são reduplicadas e, simbolicamente, acentuadas pelas diferenças de atitude, diferenças nas maneiras de portar o corpo, de apresentar-se, de comportar-se em que se exprime a relação com o mundo social” (BOURDIEU, PIERRE. 1979 – “A Distinção – crítica social do julgamento”)

O Brasil é um dos países do mundo que possui uma grande diversidade cultural, devido a fatores históricos, como colonização, escravidão, imigração, além de tamanho territorial, grande população, etc. Isso não impede que dentro da cultura brasileira existam outras culturas totalmente opostas e que produza de forma totalmente diferente os corpos dos indivíduos. O Rio de Janeiro é uma grande cidade litorânea brasileira, considerada uma das mais bonitas paisagens do nosso país, e também possui um dos maiores contrastes sociais. Enquanto podemos analisar a população da Barra de Tijuca, bairro mais nobre do Rio de Janeiro, vamos observar pessoas que se enquadram nos padrões de beleza que a mídia produz (bronzeadas, aparentemente saudáveis, corpos aparentemente perfeitos...), os hábitos, comportamento e escolhas, são pré-determinados por esse meio, essas pessoas vão freqüentar academias para manter seus corpos em forma para poder conviver na presença de outros corpos na praia, fazer compras no shopping para se manter na moda e poder freqüentar bons restaurantes, etc. A questão é se elas realmente fazem isso porque querem ou por que é o que se espera de alguém que vive nesse meio, quer fazer parte dele e não deseja se sentir excluído. Ao mesmo tempo podemos analisar outra cultura carioca, o morador da Rocinha, pouco provável que vá ao shopping para fazer compras, pois não terá poder aquisitivo para tal prática de consumo, também não deve ir à mesma praia que os moradores da Barra, pois não será bem visto pelos freqüentadores do lugar; não deve comer fora de casa; e acaba escolhendo o convívio na comunidade para se entreter. A questão é será mesmo que escolheu ficar na comunidade ou a sociedade não lhe deu opções, mas aqueles que conseguem ver outras alternativas, acabam se envolvendo com drogas, tráfico, etc. Se as opções são moldadas e pré determinadas pelo coletivo social são responsabilidades desse coletivo, então se as escolhas, independente de boas/certas/legais ou ruins/erradas/ilegais também são de responsabilidade desse mesmo coletivo.

CORPO É CULTURA

Os indivíduos incorporam a cultura em que vivem através de experiências culturalmente padronizadas – sensações, percepções e sentimentos.

Modos de atenção somáticos são o meio pelo qual temos consciência de outros corpos proporcionando criar e manter redes de relações com eles, modos de atenção culturalmente elaborados de dar atenção ao próprio corpo e de lidar com ele em ambientes que incluem a presença corporal de outros. A cultura pode se materializar através do corpo.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009


“A loucura é a vizinha da mais cruel sensatez. Engulo a loucura porque ela me alucina calmamente.” (Lispector, Clarice - 1974)

Ações da Campanha Nacional do Laço Branco em Porto Alegre - 04 e 06 de dezembro


Na noite de 4 de dezembro esteve na Faculdade de Enfermagem da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) Elisiane Pasini, Doutora em Antropologia e Coordenadora Adjunta da Themis Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero, ministrando uma palestra sobre a Campanha Nacional do Laço Branco: homens pelo fim da violência contra as mulheres para estudantes do curso de Análise de Políticas e Sistemas de Saúde – Saúde Coletiva. A Campanha Nacional do Laço Branco é uma iniciativa da Rede de Homens pela Equidade de Gênero (RHEG) uma articulação nacional de grupos unidos pela promoção da equidade de gênero, atuando junto aos homens e promovendo a crítica à cultura machista. A Campanha do Laço Branco tem por objetivo sensibilizar, envolver e mobilizar os homens em ações pelo fim de todas as formas de violência contra a mulher, atuando concomitante com as ações dos movimentos de mulheres, feministas e outros movimentos em prol da equidade de gênero e justiça social.

No dia 6 de dezembro, no Brique da Redenção, realizamos uma atividade pública sobre a Campanha do Laço Branco. A manifestação contou com a participação de membros da Themis, Grupo Atitude – Protagonismo Juvenil, Nuances – grupo pela livre expressão sexual, representantes do Coletivo de Mulheres da UFRGS e da comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, e estudantes do curso de Análise de Políticas Públicas e Sistemas de Saúde (UFRGS). A questão da violência contra as mulheres está deixando de ser apenas um problema jurídico para ser visto com outro olhar, um caso de saúde pública e um problema de responsabilidade de toda a sociedade. Com esse objetivo nos reunimos, através da ação realizada e tivemos a oportunidade de sensibilizar parte da população, mais do que apenas entregar panfletos, estabelecemos um diálogo com muitas delas. Em geral, a receptividade da população foi boa, entretanto, algumas pessoas ainda se mostraram indiferentes e, algumas vezes, até demonstraram resistência a nossa abordagem. Acreditamos que práticas como essa colocam em pauta a discussão dessa temática e a necessidade das campanhas. Como diria Madre Teresa de Calcuta: “Sei que meu trabalho é uma gota no oceano, mas sem ele, o oceano seria menor”. Entretanto, podemos acrescentar a essa fala que esse trabalho pode ser uma gota no oceano, mas essa gota poderá ser um oceano para vida de alguém.

Fabiano Barnart – Acadêmico do curso de Análise de Políticas e Sistemas de Saúde – UFRGS.


Publicado em:

http://www.themis.org.br/index.php?mod=noticias&act=view&id=1260144683

http://www.lacobranco.org.br/

sábado, 14 de novembro de 2009

Abordagem antropológica para avaliação de políticas sociais

Ao iniciar a reflexão sobre o tema proposto, tive dificuldade de entender a questão apresentada. Analisando a pergunta da Professora Tatiana, fiquei imaginando o que significa “possibilidades de coexistência” em relação às políticas públicas e à diversidade cultural. No meu entender, discutir possibilidades significa uma circunstância possível, que pode ser, ter sido ou vir a ser real; uma hipótese, opção ou alternativa possível. O estranhamento ocorreu quando tive a impressão de que a pergunta se refere a alguma coisa que ainda não coexiste, mas a diversidade cultural existe, assim como as políticas sociais para área da saúde já são uma realidade. Então, não deveríamos analisar a coexistência em vez de analisarmos a possibilidade de coexistência* Analisar a possibilidade dá impressão que essas realidades não existem.
Entretanto, após a leitura do texto “Abordagem antropológica para avaliação de políticas sociais” que traz uma proposta para melhor eficiência dos programas sociais na área da saúde. A autora do artigo apresenta a abordagem antropológica trazendo a importância de um olhar subjetivo para avaliação dos programas sociais como uma alternativa para avaliação das políticas de saúde, porém afirma também que esta prática não está neutra ou isenta de contradições, pois o pesquisador envolvido tem sua própria visão de mundo que irá influenciar no processo investigatório, assim como nas conclusões de seu trabalho.
Não há como efetuar o desenho de qualquer política pública, seja na área da saúde ou em qualquer outra área, ignorando a diversidade cultural, se o objetivo é a eficiência dessa política. A possibilidade de eficácia de determinada política pública aumenta quando seus idealizadores levam em consideração as diversidades culturais. É utópico que o desenho de uma política pública pode ser destinado a toda uma população, como do nosso país por exemplo. A idéia de submissão também me causa estranhamento, pois não relaciono eficácia com submissão, vejo submissão como a aceitação de um estado de dependência e acredito que em vez de aceitação/submissão o objetivo é a apropriação da idéia, é fazer com que a população-alvo de determinada política pública compreenda e saiba a importância de determinada prática seja de prevenção, promoção ou vigilância em saúde. A coexistência da diversidade cultural e das políticas de saúde está diretamente relacionada a quanto os formuladores dessa política conseguem entender a realidade da sua população-alvo, levando em consideração suas questões morais, culturais, valores, atitudes e crenças e, assim, proporcionando uma eficiência na sua implementação.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

ENSAIO CRÍTICO DO FILME “O OUTRO LADO DE HOLLYWOOD” E DO TEXTO “CINEMA E SEXUALIDADE”





UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
DISCIPLINA GÊNERO E SEXUALIDADE NOS MODOS DE SUBJETIVAÇÃO CONTEMPORÂNEOS
PROFESSOR HENRIQUE CAETANO NARDI
GRADUAÇÃO EM ANÁLISE DE POLÍTICAS PÚBLICAS E SISTEMAS DE SAÚDE



Esta resenha crítica tem por objetivo estabelecer uma relação entre o documentário reproduzido em aula - “O Outro Lado de Hollywood” de Rob Epstein e Jeffrey Friedman - e o texto de referência - “Cinema e Sexualidade” de Guacira Lopes Louro - além de uma síntese descritiva e crítica. Para auxiliar na construção desse trabalho também foram assistidos os filmes: “De Repente, no Último Verão” (Studdenly, Last Summer, 1959) de Joseph L. Mankiewicz; Transamérica (2005) de Duncan Tucker; “Desejos Proibidos” (If These Walls Could Talk 2, 2000) de Jane Anderson/1961, Martha Coolidge/1972 e Anne Heche/2000; “Traídos pelo Desejo” (The Crying Game, 1992). O documentário exibido em aula e texto abordam as temáticas de sexo, gênero e sexualidade na história do cinema, quais os impactos e as influências que refletem em nossa sociedade na construção das identidades sexuais.
O “O Outro Lado de Hollywood” é um documentário que aborda a sexualidade na história do cinema, desde sua origem, assim como referências LGBTT – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Transgêneros - de diversos filmes, algumas que podem passar desapercebidas por quem assiste. O documentário está estruturado alternando cenas de filmes, como alguns clássicos do cinema, filmes alternativos e de todas as décadas com trechos de depoimentos de pessoas famosas, atores, produtores, diretores, etc.
O código Hays de censura cinematográfica, apontado tanto no documentário, quanto no texto, foi instituído em 1934, por Will Hays, e estabelecia regras referente aos temas que não poderiam ser abordados no cinema. As regras eram invioláveis e não poderia ser representado nas telas: beijos de boca aberta, perversão sexual, sedução, estupro, aborto, prostituição, nudez, obscenidades, etc. “... a identidade homossexual simplesmente não existia.” - Guacira Lopes - Tinha por objetivo livrar a moral e os bons costumes americanos da influência lasciva dos filmes de Hollywood, segundo seu criador, nem que para isso fosse necessário trocar palavras dos roteiro, alterar personalidades e tramas.
Por isso, durante muitos anos os homossexuais não podiam ser retratados explicitamente nos filmes, mas isso não eliminou definitivamente a homossexualidade das telas, mas a tornou mais difícil de se identificar, não era mencionada, todavia continuava sendo representada e chamava a atenção do público gay. Todos os espectadores querem se ver representados nas telas e foram criados, nos filmes, sinais de homossexualidade em detalhes, gestos sútis ou nas entrelinhas dos diálogos entre os personagens. O público gay aprendeu a identificar essa forma semi oculta ou codificada de expressão, que passou a ser utilizada também no cotidiano, assim como nos filmes.
O texto de Guacira Lopes também utiliza exemplos de vários filmes para abordar a questão da homossexualidade na história do cinema e está divididos em quatro partes principais:



Ingênuas ou Fatais & Heróis ou Canalhas: Nos anos 50, período do pós guerra, fez-se necessário uma estratégia para promover a volta ao lar as mulheres que adquiriram certa independência e deter o avanço do movimento feminista , o objetivo era chamar a atenção do público com personagens de personalidades bem definidas e posicionadas, ensinava a diferenciar o certo e o errado e representar isso através do caráter desses personagens. Os personagens “bonzinhos” eram aqueles que tinham condutas que estavam dentro da normalidade imposta pela sociedade, para esses era reservado um final feliz, enquanto os “malvados”, representados por condutas sexuais questionáveis ou colocavam em risco a instituição sagrada da família ou a sociedade enquanto sistema, tinham um desfecho trágico e digno de pena. Inicialmente a homossexualidade foi representada no cinema, como fonte de humor por personagens caricatos (“Eram todos muito afetados, estes magros homens brancos com pequenos bigodes...” - Woopi Goldberg) que faziam o público rir, sentir pena com os finais trágicos para quem demonstra uma sexualidade fora dos padrões de aceitação social ou temer com os vilões que querem “perverter sexualmente” os /as mocinhos (as). Desde os filmes mudos já haviam representações dos homossexuais através de mimicas e gesticulações efeminadas das personagens, que estavam estabelecendo um esteriótipo do homossexual para sociedade, ninguém falava a respeito, mas todos sabiam o que estava sendo representado, a única manifestação da platéia eram as risadas. Os filmes tem o poder de "ensinar" o público a formar uma opinião em relação a realidade, neste caso ensinar os heterossexuais o que pensarem em relação aos gays e os gays o que pensarem de si mesmos.



De Repente... o Homossexual Entra em Cena: A primeira aparição de um personagem homossexual – Sebastian – em um filme comercial americano foi em “De Repente, no Último Verão” (Studdenly, Last Summer, 1959). A homossexualidade do personagem é sugerida pela descrição de sua personalidade, marcada pela afetação, arrogância e excentricidade. Não somente por essas características, mas também pelos relatos de sua prima Catherine (Elizabeth Taylor): “Sebastien era uma vocação, não era um homem.” / “...todos gostavam dele: homens, mulheres, crianças, minerais e vegetais.” - afirmando também que junto com sua tia Violet (Katherine Hepburn) eram usadas como iscas de Sebastian para atrair “os melhores peixes para rede”. O Dr Crucroviks (Montgomery Glift) trabalhava no hospital Lion Wiew State Asylum, as péssimas condições do hospital ficam evidentes, a sala de cirurgia desmoronando e as luzes apagando durante um procedimento de lobotomia. Violet afirma ter intenções de criar a Fundação Sebastien Venable, em memória ao seu filho falecido, que teria por objetivo financiar os jovens médicos promissores e sem recursos como o Dr. Crucrovicks, mas na realidade tentava persuadi-lo a realizar um procedimento de lobotomia em sua sobrinha Catherine, que havia sido internada no Hospital Sta Maris, após a morte de Sebastian. A real intenção de Violet é silenciar sua sobrinha, unica testemunha do que realmente aconteceu com seu filho. Sebastian não tinha falas durante o filme, nem mesmo seu rosto foi mostrado, foi representado como um monstro que não deveria ser mostrado e assim morreu como um monstro - pode-se até fazer uma analogia com o personagem Frankenstein - como foi mostrado no documentário - foi perseguido por flagelados famintos e devorado (no sentido literal), ele merecia morrer. Um final trágico para uma sexualidade fora dos padrões e um final feliz aos mocinhos (as) que ficam juntos: Sebastian e Catherine.



Muitas Formas de Amar: O filme Desejos Proibidos (2000) está dividido em 3 histórias que se passam em uma mesma casa, mas em épocas diferentes. Na primeira história, que se passa em 1961, Edith (Vanessa Redgrave) que tevem uma relação durante 50 anos com Abby (Marian Seldes), tem que enfrentar a morte da sua companheira, que morre após uma fatalidade, mas além de enfrentar a dor da perda tem que lidar com o fato de não ser legitimada como companheira. Tanto no hospital com a diferenciação com que a mulher que perde seu marido e a “amiga”, quanto pelos herdeiros de Abby, ela se vê obrigada a suforcar silenciosamente o verdadeiro sentimento e é tratada como uma amiga da falecida. No segmento do 1972, quatro amigas e estudantes universitárias que moram juntas, são expulsas de um grupo feminista por serem lésbicas – as feministas são categóricas ao dizer que a prioridade é lutar pelos diretos das mulheres e que naquele momento, no grupo, não há espaço para as lésbicas. Linda (Michelle Williams) e suas amigas vão ao único bar gay da cidade, onde acaba conhecendo Amy (Chloë Sevigny) e se apaixona. Enfrenta os próprios preconceitos, pois Amy se veste como homem, e de suas colegas e amigas feministas que lutam para se livrar dos padrões de dominação masculina. No último episódio, no ano de 2000, é abordado de uma perspectiva mais amena, trata-se da história de um casal de lésbicas, Fran (Sharon Stone) e Kal (Ellen DeGeneres), que desejam ter um filho somente delas. Mostrando as dificuldades para encontrar o doador de sêmen ideal.



Travessias: nesta parte a autora fala sobre filmes que se passam em um ambiente de viagem, fazendo uma alusão as transformações, não apenas como um rito de passagem, mas as transformação biologicas.
Transamérica (2005) é um road-movie, ou seja, um filme que se ambienta durante uma viagem, dando a idéia de travessia e mudança, assim como o título no cartaz do filme o prefixo TRANS está diferenciado da palavra AMÉRICA (TRANSAMERICA), dando uma idéia de transformação, mas também fazendo uma referência a personagem principal que é uma transsexual – Bree (Felicity Huffman). Bree tem como principal objetivo de vida a cirurgia de mudança de sexo, quando está quase realizando seu sonho, recebe uma ligação que poderá adiar seu grande desejo. Através dessa ligação, descobre que tem um filho adolescente (Toby – Kevin Zegers), consequência de sua única relação heterossexual durante os tempos de faculdade. Pressionada por sua terapeuta e melhor amiga , acaba cruzando a América do Norte de leste a oeste para encontrar seu filho, a viagem de ida representa um resgate de suas raízes heterossexuais e a volta uma prova de que realmente estaria pronta para a transformação – a cirurgia.



The Crying Game (1992) de Neil Jordan: vencedor de 18 prêmios e 16 indicações, é um filme marcante e com incríveis lições de vida. Jody (Forest Whitaker) é um soldado britânico na Irlanda, atraido por Jude (Miranda Richardson) para uma emboscada, acaba sequestrado pelo Exército Republicano da Irlanda que deseja obter na troca do soldado a libertação de um de seus maiores líderes preso no Reino Unido. No cativeiro Jody torna-se amigo de seu carcereiro Fergus (Stephen Rea), com quem compartilha suas últimas 72 horas de vida. Fergus tem a missão de executar Jody caso a exigência de libertar seu companheiro não seja atendida. O filme então dá a idéia de ser um filme que trata de ideais políticos, mas paulatinamente a trama vai se alterando. A relação entre ambos se estreita e compartilham risadas, segredos e confições. Jody divide com seu companheiro que tem uma quase esposa Dil (Jaye Davidson), revela esse amor, diz que mulheres são encrenca, mas que Dil não é encrenca. Pede para seu amigo que após sua morte procure por ela, leve-a para tomar um Martini no bar O MÊTRO e diga que pensou nela em seus últimos momentos de vida. Jude é uma mulher sedutora, dura e sua personalidade demonstra requintes de crueldade, após ser subtamente atacada por Jody, torna-se insensível e indiferente a situação dramática e humilhante em que se encontra o soldado inglês e, acaba o agredindo covardemente, ao contrário de Fergus que fica cada vez mais próximo da vítima. No momento da execução de Jody, o soldado irlandês motivado por uma mistura de solidariedade, pena e culpa, tira o capuz do refém, para que esse não morra como um animal. Aproveitando a situação, a vitima corre pela floresta na tentativa de salvar sua vida, ironicamente morre atropelado por um tanque de guerra daqueles que deveriam salvá-lo.
Após a morte de Jody, Fergus foge de barco para o Reino Unido, com o objetivo de tornar-se um Sr. Ninguém (como o chama Jude quando se reencontram), um operário de obras anônimo que trabalha para o mesquinho Deveroux (Tony Slattery). Em Londres tentando se redimir da culpa pela morte de Jody, procura a quase esposa do falecido amigo. Dil é uma transexual bem resolvida, bonita, superticiosa, autentica (Não posso evitar o que sou. - diz se afirmando) e trabalha de cabeleireira.
Surpreendendo tanto o protagonista como o espectador, ambos podem ficar com cara de bobos ao descobrir a verdade de Dil. Fergus se acha o espião no estilo da máfia irlandesa, mas acaba estarrecido quando Dil revela por inteiro seu corpo andrógeno. Em um misto de nojo e repúdio, Fergus corre ao banheiro para vomitar.
Jude volta a aparecer, junto com seu cúmplice Maguire (Adrian Dunber), chantageiam Fergus para que mate um juiz, mas acabam se dando mal. Maguire é morto pelos seguranças do juiz e Jude vai atrás de Fergus para se vingar e acaba sendo morta por Dil. No final Fergus assume a culpa do crime no lugar de Dil, o filme termina com Dil indo na cadeia visitar Fergus e supõe que após obter sua liberdade, os dois acabem juntos.
A construção de quem nós somos vem da nossa cultura, aprendemos o que é ser homem ou o que é ser mulher e o que é sexualidade através de padrões que estão pré-estabelecidos de acordo com a época em que vivemos. Através dos questionamentos que trazem para o nosso cotidiano, os filmes são capazes de construir, modificar e destruir tabus.